terça-feira, 24 de maio de 2016

O que os outros vão pensar de mim?

Uma das frases mais ouvidas no consultório é esta: o que os outros vão pensar de mim? Eu costumo devolver: os outros sempre vão pensar! Se você for correto, vão pensar; se você for desonesto, vão pensar; se você for bom, vão pensar; se você for mal, vão pensar; se você fizer muitas coisas, vão pensar; se você não fizer nada, vão pensar! Falaram das grandes personalidades do progresso e das maldosas, você vai escapar?

O que mais incomoda, o que elas pensam de você ou o que você pensa que elas pensam de você? Estar muito preocupado com a opinião dos outros não é sinal de conflitos pessoais? O que os outros pensam de você é mais importante do que sua autoavaliação?

As pessoas negativas, pessimistas e conflitadas interpretam tudo que se refere a elas como pessoal, ofensivo e persecutório, elas não aproveitam nada do que vem dos outros, que não deixam de ser seus professores indiretos. O neurótico justifica este posicionamento relacionando as várias vezes que foi ofendido, ressaltando o lado ruim das pessoas. Os indivíduos mais maduros, sempre estão aprendendo, veem nos “adversários” instrutores, como ensina o Espiritismo. É claro que há pessoas maldosas que precisamos identificar e nos guardar para preservar a vida e a integridade. No entanto, a pessoa madura não vê ameaça em tudo e em todos sua capacidade de discernir é mais ampla, não é unilateral. Fazendo esta distinção entre a pessoa neurótica e a madura, lembrei do ensinamento de Jesus: “Pois àquele que tem lhe será dado, e terá com abundância; mas àquele que não tem até o que tem será tirado dele.”1 A pessoa madura aproveita melhor sua existência, por isso tem capacidade de obter mais aprendizados existenciais do que o neurótico que fica preso em seus tormentos sem aproveitar melhor as ofertas da vida. 

segunda-feira, 16 de maio de 2016

Surto ou obsessão espiritual?

Na sessão de psicoterapia ele pedia para não fechar a porta da sala, para não se sentir vulnerável. Mal conseguia falar, respiração ofegante, assustado, dizia-se revoltado, mas não explicava o motivo. Com vinte minutos de sessão, já queria ir embora, ele não conseguia ficar os cinquenta minutos. Ele dizia que tinha algo muito importante para me falar, mas não conseguia. Depois de algumas sessões, com muita ansiedade e falando pouco, disse que em uma vida anterior eu o teria prejudicado, levando, em seguida, a morte, por isso me procurou: para se vingar! Fiquei sem ação, o que? Perguntei:
- Como você sabe disso?
- Eu vi isso nos meus sonhos – disse ele!

Como psicólogo eu diria tratar-se de fantasias dele, o sonho pode ser reflexos das preocupações do dia, desejos não realizados, mas como Espírita sabemos que podem ser retrocognições, obsessão espiritual (pesadelo), sonhos premonitórios e encontros espirituais. Como saber? Eu não tenho percepções parapsíquicas ou mediunidade ostensiva para alcançar a veracidade dos fatos, no entanto um misto de intuição (percepção pessoal) e de inspiração (influência de meu mentor) indicava não ser verdadeiro o que o cliente dizia. Nem sempre é possível desvendar o passado para segurança dos envolvidos, a fim de não ficarem fantasiando coisas e caírem em auto-obsessão e também na obsessão espiritual, onde o obsessor aproveita para incrementar mais as nossas ilusões. Não que eu seja contra a informação mediúnica quando é útil ao indivíduo, ou através da retrocognição que é um fenômeno anímico, humano, natural que estamos desenvolvendo no processo evolutivo. Sou a favor, mas precisamos separar a curiosidade doentia da informação útil, que vai ser proveitosa para o crescimento do sujeito.
Agora compreendia o motivo de sua angústia e embaraço em falar comigo. Pessoalmente nada sentia em relação a ele, nem simpatia, nem aversão, que são indicadores de vínculos.
O cliente não apresentava nenhum comprometimento psíquico grave, era um pouco isolado, trabalhava, havia estudado. Não parecia ser um surto, tinha coerência em seu raciocínio quando conversávamos sobre outras coisas. Cumpria o contrato terapêutico: dia e horário, pagamento, não ligava desnecessariamente fora da sessão... Parecia ser uma obsessão espiritual, havia momentos que ele tinha o olhar fixo em mim com um misto de raiva e cordialidade!
Por conta da ameaça que me fez, da vingança, tive que cancelar o tratamento. Por vias das dúvidas, encaminhei-o a um psiquiatra para fazer uma avaliação, e, ao mesmo tempo, indiquei que procurasse um Centro Espírita para verificar se estava obsediado.  


quarta-feira, 11 de maio de 2016

Nunca se case!

Qual é a força da sua fala, até onde ela pode chegar? Você acha que o que diz evapora no ar sem tocar ninguém? Quem é o seu interlocutor, alguém vivido que sabe se proteger ou uma criança indefesa?
Imagine o cenário de um ambiente familiar, os filhos brincando ou fazendo seus deveres escolares, e de fundo a mãe reclamando aqui e ali do marido que vai chegar. No meio da reclamação ela afirma aos filhos: “nunca se casem para não levarem essa vida de inferno que levo!”, ou “o amor não existe, ninguém nunca vai te amar”. Quando não é a queixa do casamento, é a lamentação da vida: “a vida só traz sofrimento”, e arremata dizendo aos filhos quando estão brincando e fazendo bagunça: “vocês ainda vão me matar de trabalhar”. Não bastasse o terrorismo da mãe desequilibrada, o pai estressado chega do trabalho, mal cumprimenta a esposa e os filhos e despeja sua lista de reclamações: “as empresas só nos exploram!”, “o patrão faz todo mundo de escravo!”, “nunca confie em ninguém!” Para este casal tais colocações/reclamações soa como natural, falar do que lhes desagrada. Na vida de relação reclamar faz parte da pauta do dia a dia de muita gente, está tão incorporada nos relacionamentos interpessoais que não se percebe sua nocividade.
As atitudes dos pais estão sugerindo, induzindo, exemplificando como é a vida e o que os filhos vão encontrar pela frente. A mãe está ensinando que o casamento não é um bom negócio e é fonte de sofrimento, o pai lecionando que o trabalho é motivo de exploração e escravização. Estas imagens vão se assomar a mente dos filhos servindo de paradigma – como a vida é e como devem se comportar. A maior ou menor aceitação dessas sugestões dependerá do nível evolutivo dos filhos, que com o filtro do discernimento vão perscrutar o que recebem dos pais guardando ou rejeitando o que é bom e o que é ruim. Isso mostra que os filhos não estão à mercê dos pais ou da sociedade, mas das suas conquistas evolutivas ou da falta delas.
Do ponto de vista da sociedade materialista, a esposa infortunada com o seu casamento e o marido irrealizado em sua profissão são vítimas do azar, do destino, por isso eles se acham no direito de reclamar, por que estão em uma situação não escolhida. Na perspectiva do Espiritismo que supera essa analise estreita, casualista, o casal está incurso na Lei de Causa e Efeito, portanto, quando a esposa/mãe reclama aos filhos da instituição “casamento”, como algo ruim que traz sofrimento, ela está atribuindo valores pessoais, particulares, a algo abstrato comum a todas as pessoas. Ela deveria dar mais precisão as suas colocações: “o meu casamento é difícil”, “a minha prova com o pai de vocês é árdua”. O mesmo se aplica ao esposo/pai, se ele tem uma subprofissão, no qual não se realiza, é provável que seja uma prova pessoal e não comum a todos os trabalhadores. Ainda outra informação que o Espiritismo esclarece, é que se os filhos não têm provas difíceis no casamento e na profissão, eles não vão passar pelos sofrimentos que os pais passam como supõe a mãe ao “preveni-los” com suas reclamações, exceto se neurotizarem a relação e fizerem escolhas erradas.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Pés grandes

Como quantificar o grau de estresse ou de tormentos que a sociedade nos causa com o trânsito, a violência, o clima, a competição, etc., e qual é o percentual pessoal de problematizar a vida? Trocando em miúdos, é a sociedade complexa que nos atormenta, ou nós nos atormentamos com a sociedade? Obviamente as duas partes tem a sua quota de elementos afligentes. Como não podemos mudar o mundo, podemos mudar a nós mesmos, superando os melindres, as crenças falsas, a baixa autoestima, etc.
Um rapaz procurou a psicoterapia angustiado, triste, não queria mais sair de casa, ficava trancado em seu quarto o dia todo escutando música. Os pais não sabiam mais o que fazer, pensavam que ele estivesse usando drogas ou tinha alguma “doença mental.” Na terapia ele deu voltas para falar do assunto que o afligia: os seus pés! Isso mesmo, os seus pés. Achava que seus pés eram grandes demais, tinha vergonha que as pessoas olhassem para eles. Usava calças largas ou a boca da calça mais larga para cobrir seus pés. Virou uma paranoia, ficava monitorando os olhares dos outros, via o que não existia.
Essa cisma começou no ensino fundamental, onde é comum a garotada colocar apelidos uns nos outros. Qualquer coisa diferente em um colega é motivo para gozação: gordo, magro, alto, baixo, mãos grandes ou pequenas, nariz grande ou pequeno, pés grandes ou pequenos, enfim, tudo é motivo para chacota. Meu cliente não tinha os pés enormes, pela altura dele era para calçar 42, e calçava 44, quase imperceptível por sua altura. O apelido de pezão pegou mais pelo incomodo do rapaz, do que pelo tamanho do pé. O sentimento de inferioridade que alimentava contribuiu para acatar as gozações como verdadeiras. Quando os amigos tiravam sarro, ele ficava vermelho, paralisado, se sentindo pior como pessoa.
Quantos homens se sentem inadequados por causa da barriga, da calvície, da profissão, da altura, etc., evitando o convívio social ou até um relacionamento afetivo porque se acham inadequados?
As mulheres têm áreas pontuais de queixa: cabelos, seios, bumbum, pernas, rugas, celulites e barriga.

Não são estas condições em si que causam o sofrimento ou a falta de aceitação, mas o que se pensa delas. Uma pessoa “resolvida”, com boa autoestima e autoconfiança não se limita, nem se paralisa se suas formas não forem perfeitas. Por outro lado, uma criatura “perfeita nas formas”, com baixa autoestima, insegura vai arranjar motivos para ser infeliz. Aqui cabe ponderar também o nível de evolução de cada pessoa.